quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Oito dias antes

ALASCA ENTROU NO QUARTO logo no primeiro dia de aula e se sentou ao lado do Coronel no sofá. O Coronel estava ocupado, trabalhando, tentando bater um recorde de velocidade terrestre no Playstation.
Ela não disse que tinha sentindo nossa falta, nem que estava feliz em nos ver. Simplesmente olhou para o sofá e disse: — Vocês estão mesmo precisando de um sofá novo.
— Por favor não fale comigo quando estiver dirigindo, — disse o Coronel. — Santo Deus! — Será que o Jeff Gordon também precisa aturar esse tipo de coisa?
— Tive uma ideia, — ela disse: — É ótima. Precisamos de um pré-trote que coincida com um ataque a Kevin e seus capangas.
Eu estava sentado na cama, estudando para a prova de historia norte-americana do dia seguinte.
— Pré-trote? — perguntei.
— Um trote com o propósito de induzir a reitoria a uma falsa sensação de segurança, — o Coronel respondeu, irritado com a distração.
— Depois do pré-trote, o Águia vai pensar que os calouros já fizeram seu trote e vai estar desprevenido quando a coisa realmente acontecer. Todo ano, os calouros e os veteranos faziam alguma espécie de trote – geralmente, algo bobo, como soltar rojões no circulo dos dormitórios as cinco da manhã de um domingo.
— Todo ano fazem pré-trote? — perguntei.
— Não, seu idiota, — disse o Coronel. — Se todo ano fizéssemos pré-trote, o Águia ia esperar dois trotes. A última vez que isso aconteceu foi em... hmm. Ah, sim: 1987. Na época, o pré-trote foi cortar a energia do campus, e o trote verdadeiro foi colocar quinhentos grilos vivos no sistema de aquecimento das salas de aula. Às vezes, ainda e possível ouvir o canto deles.
— Sua técnica de memorização mecânica é muito impressionante, — eu disse.
— Vocês dois parecem um casal de velhinhos. — Alasca abriu um sorriso. — É meio Assustador.
— Você não sabe nem a metade, — o coronel disse. — Precisa ver o garoto à noite, querendo subir na minha cama.
— Ei!
— Vamos voltar para o assunto! — disse Alasca. — Pré-trote. Este fim de semana, já que é lua nova. Vamos ficar no celeiro. Você, eu, o Coronel, Takumi e, como presente para o meu gordinho, Lara Buterskaya.
— A mesma Lara Buterskaya que eu cobri de vomito?
— Ela só é um pouco tímida. Mas ainda gosta de você. — Alasca riu.
— O vomito fez você parecer... Vulnerável.
— Peitos bem firme, — o Coronel disse, — Esta levando o Takumi pra mim?
— Você precisa ficar solteiro por uns tempos.
— Verdade, — o Coronel disse.
— Continue jogando videogame por mais alguns meses, — ela disse.
— A coordenação motora vai ser uma mão na roda quando você chegar à terceira base.
— Credo, faz tanto tempo que não ouço falar do sistema de bases que até esqueci o que é a terceira base, — respondeu o Coronel. — Eu reviraria os olhos para você, mas não posso me dar ao luxo de olhar para o lado.
— Primeira base: beijo de língua. Segunda: buzinada. Terceira: bolinada. E quarta: biscoitada. Parece até que pulou a terceira série! — disse Alasca.
— Eu pulei a terceira série, — replicou o Coronel.
— Então, — eu disse, — como vai ser o pré-trote?
— Eu e o Coronel pensaremos em alguma coisa. Você não precisa se meter em confusão – por enquanto.
— Tudo bem, então. Vou sair para fumar um cigarro.
Saí. Não era a primeira vez que Alasca me excluía, mas, depois de todo o tempo que passamos juntos no feriado de Ação de Graças, pareceu-me ridículo ela querer planejar o trote só com o Coronel, sem mim. De quem era a camiseta ensopada de lagrimas? Minha. Quem tinha aturado a leitura de Vonnegut? Eu. Caminhei até a loja de conveniência do outro lado da rua e fumei um cigarro. Isso jamais teria acontecido comigo na Flórida, essa insegurança tão-coisa-de-primário sobre quem gosta mais de quem, e eu me odiei por deixar isso acontecer comigo. Você não precisa se importar com ela, pensei. Ela que se dane.

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